Alimentação é muito mais do que um ato de comer

Falar de alimentação é não tão simples quanto parece. Existem muitas formas de abordar o assunto. Há quem pense somente na relação do alimento com a saúde, outros na distribuição equitativa de alimentos para reduzir a fome, e existem aqueles que estão mais preocupados com a questão econômica, com a produção de alimentos em larga escala. E por aí vai… Interesses vão movendo os discursos e as perspectivas sobre o assunto alimentação.

Aqui eu vou me deter um pouco na questão da escolha dos alimentos, um comportamento que parece “banal”, mas é extremamente complexo se pararmos para pensar nos diferentes fatores que implicam nas nossas escolhas. De modo geral, achamos que as nossas escolhas alimentares são baseadas na fome.  Só que não. Existem outros fatores que irão juntamente influenciar nossas escolhas, nossa relação com os alimentos e, consequentemente, nossa saúde física, emocional e social.

Deram explica no seu livro O PESO DAS DIETAS que existem 4 tipos de fome:

  1. Fome fisiológica: quando o organismo precisa receber alimentos.
  2. Fome social: está relacionada ao contexto social que estamos vivenciando, como festas e reuniões sociais.
  3. Fome específica: quando sentimos a vontade de comer algo que nos dá algum tipo de prazer, mas nada fora do controle.
  4. Fome emocional: caracterizada pela “necessidade” de comer algo gostoso, ela vem com urgência. Aqui mora o perigo, pois muitas vezes o consumo fica descontrolado e sem impulsivo.  

Podemos ter várias formas de fome, que associados aos diferentes fatores vão, em grande medida, influenciar nossas escolhas alimentares. Aqui vou listar alguns desses fatores e apresentar algumas considerações de forma resumida, pois a assunto é tão denso que dá para escrever uma coleção de livros. Vamos lá:

  • Fatores biológicos: nosso organismo necessita de uma conjunto de macronutrientes (carboidratos, gorduras e proteínas), micronutrientes (vitaminas e minerais), além de diversas substâncias fitoquímicas presentes nos vegetais, entre tantas outras. Associada a essas necessidades, nosso organismo tem “sensores” no cérebro que nos apontam quando estamos como fome, quando estamos satisfeitos…, mas nem sempre o funcionamento desses “sensores” está equilibrado. O resultado é a incapacidade de percebermos a quantidade excessiva de alimentos que estamos consumindo. Ainda no aspecto biológico, algumas propriedades organolépticas, como o paladar (o sabor do alimento), o olfato (o cheiro do alimento) e a visão (a aparência dos alimentos) são fortemente impactantes na hora da escolha e do porcionamento dos alimentos.
  • Fatores psicológicos: as emoções são outro fator que tem um impacto muito forte nas escolhas dos alimentos. O estresse da vida contemporânea cada vez mais está associado com as escolhas alimentares. Do mesmo modo o humor, que tanto pode ser influenciado pelo alimentos, como pode ajudar na escolhas de alimentos que terão como missão aplacar a ansiedade ou dar um pouco de conforto.
  • Fatores sociais: as questões sociais são determinadas pelo contexto social, pelas influências culturais, pelos fatores econômicos. Todo mundo sabe que o dinheiro, em grande medida, influencia nossas escolhas. Isso pode ser observado para as boas escolhas, pois comer cereais integrais é mais caro que os refinados, e comprar frutas sortidas nem sempre cabe no bolso da maioria da população. Igualmente, quando mais renda maior as possibilidades de comprar mais alimentos ultraprocessados (aqueles com uma infinidade de ingredientes nos rótulos). Ou seja, ter mais renda tanto para aquisição de alimentos, bem como ter mais conhecimento não afeta diretamente as escolhas. É fato que o ambiente em que vivemos tem muita influência nos nossos hábitos alimentares. Estudos mostram que as relações sociais são um aspecto importante do ambiente social e podem influenciar na escolha de alimentos mais saudáveis. Os aspectos espirituais, semelhantemente, modulam as escolhas de alguns grupos sociais.

Esses fatores são tidos como grandes influenciadores no comportamento alimentar, podendo estar associados entre si; no entanto eles não são rígidos e seus impactos diferem em diferentes grupos conforme a faixa etária, a classe social, o gênero, a escolaridade, por exemplo. Adolescentes atletas têm interesses alimentares totalmente diferentes de adolescentes que se reúnem toda noite para jogar videogame.  Essa ideia pode ser extrapolada para centenas de outros exemplos. Daí sua complexidade e a necessidade de falar nesse tema dentro de uma perspectiva de comportamento alimentar. Não é à toa que chamamos a alimentação de um fenômeno biopsicossociocultural.

No livro O DILEMA DO ONÍVORO, Pollan aborda a questão angústia de comer enfrentada por muitas pessoas. Enfrentar um supermercado com tantas opções se transformou em uma luta interna, com dúvidas e dilemas. Uma pequena lista inclui: a liberdade tolhida de ter que escolher os alimentos certos e nutritivos, de fazer a higienização certa e as combinações adequadas para ter o melhor aproveitamento das propriedades biológicas dos alimentos. Isso sem falar no momento de comprar os alimentos que devem ser locais sustentáveis e com selo de certificação. São tantas regras que transformam a alimentação um estresse a parte.

Para amenizar o estresse, deixo aqui algumas dicas de Deram (2018)

  1. Diga não ao terrorismo nutricional;
  2. Escute e respeite a sua fome;
  3. Faça as pazes com os alimentos;
  4. Pratique o comer consciente;
  5. Coma com prazer, sem culpa e sem gula;
  6. Escute e respeite a saciedade;
  7. Coma alimentos variados e capriche nas preparações.
  8. Beba água.

Por fim, minha dica é cuide-se com carinho, isso implica a comer adequadamente.

Bibliografia consultada

Conklin, Annalijn I., et al. “Social relationships and healthful dietary behaviour: evidence from over-50s in the EPIC cohort, UK.” Social science & medicine 100 (2014): 167-175.

Deram, Sophie. “O peso das dietas.” Emagreça de forma sustentável dizendo não às dietas. Rio de Janeiro: Sextante, 2018.

Imtiyaz, Hena, Peeyush Soni, and Vimolwan Yukongdi. “Investigating the role of psychological, social, religious and ethical determinants on consumers’ purchase intention and consumption of convenience food.” Foods 10.2 (2021): 237.

Pollan, Michael. O dilema do onívoro: uma história natural de quatro refeições. Rio de Janeiro: Editora Intrínseca, 2007.

Woodruff, Sandra. “200 receitas de bons carboidratos”. Rio de Janeiro: Sextante, 2004.

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