Afinal, o que é comfort food?

Comfort food é um termo usado para definir alimentos (ou refeições) que trazem sensação de “alívio”, “consolo” e “bem-estar emocional”, através do paladar, do olfato e do tato. Ele foi usado pela primeira vez em 1966, quando o jornal Palm Beach Post publicou uma matéria associando o estresse emocional à obesidade, conforme revela Spence (2017), no artigo Comfort food: a review. Desde então, o termo vem sendo associado, inclusive pela indústria alimentícia, tanto aos aspectos emocionais e de memórias afetivas, quanto ao uso terapêutico, visando a manutenção da saúde e/ou a qualidade de vida de pacientes com dificuldades alimentares.

Gimenes-Minasse (2016) alerta que o conceito do comfort food é pouco percebido na literatura brasileira. No seu artigo Comfort food: sobre conceitos e principais características, a autoratraz reflexões sobre as complexas relações que as pessoas estabelecem com os alimentos na contemporaneidade, apontando como esses alimentos são cheios de representações e simbolismos que variam de acordo com os grupos sociais.

Traduzido para o português, a comida de conforto remete às guloseimas da infância, à comida caseira, às lembranças armazenadas na memória da alma sensitiva, fortalecendo o sentimento de identidade e de pertencimento das pessoas. Ela está fortemente associada ao alívio do estresse emocional – como um mecanismo de recompensa – diante de uma situação de nostalgia, de preocupação, de pressa, de doença e conquista, por exemplo.

Geralmente a comida de conforto apresenta uma textura macia e, na sua composição, a predominância de carboidratos e gorduras, tais como bolo, chocolate, sorvete, massa gratinada. Mas também, a canja de galinha, as carnes suculentas e algumas bebidas – como o chá, o café e até a bebida alcoólica – podem ocupar a lista. As escolhas dependem da situação emocional, da faixa etária, do sexo…

Pesquisas mostraram que as mulheres buscavam a comida de conforto principalmente diante de emoções negativas e os homens, por sua vez, de emoções positivas, na qual o alimento escolhido estava relacionado à alguma comemoração. E ainda, que o desejo de saciar as emoções pode provocar na mulheres uma avalanche de sentimentos ruins (como culpa e vergonha), o que é bastante preocupante.

Embora, exista uma variedade de entendimento do que seja comida de conforto, além de certa controvérsia se ela contribui efetivamente para melhorar o humor e as emoções de seus consumidores (veja o artigo de Spence 2017), quando lidamos com pacientes debilitados, ou mesmo em cuidados paliativos, que evidenciam perda de apetite e outros impedimentos alimentares por via oral, a comida de conforto torna-se uma oportunidade de transformar a hora da refeição – muitas vezes difícil e estressante – em um momento de alegria, prazer e carinho.

Conforme a saúde da pessoa vai declinando, muitas vezes, a consistência da comida vai sendo modificada para facilitar a mastigação, a deglutição e a digestão. Os alimentos sólidos vão dando lugar aos cremosos e pastosos; tudo para facilitar o momento da alimentação. Entretanto, a repetição de uma comida amorfa fica muito monótona, mesmo variando os alimentos, as preparações, as cores. Por isso, viabilizar o desejo do paciente, com segurança, para que ele coma algo que satisfaça sua memória afetiva, no limite que ele tolerar, é uma demonstração de respeito à dignidade humana. Benarroz (2020) aponta que a alimentação é um veículo de socialização assim como uma medida terapêutica, além do que; “a alimentação e a nutrição adequadas são imprescindíveis no caminho da compaixão”.

Com tantas perdas impostas pela doença, criar oportunidades da pessoa comer em paz, com prazer e segurança é investir na sua qualidade de vida. Isso implica o diálogo com escuta e boa vontade, evitando regras e restrições descabidas. Quantas pessoas são proibidas de comer alimentos por causa de modismo ou conceitos zelo excessivo da família?

Nesse sentido, aproveito para dizer que o chocolate, apontado como comida de conforto, está na mira dos pesquisadores. Um estudo realizado na USP com pacientes idosos com câncer em cuidados paliativos mostrou que o consumo de chocolate com maior teor de cacau pode contribuir para a melhora do estado nutricional e da funcionalidade. E que o chocolate branco foi importante no combate da inflamação sistêmica e na defesa contra o estresse oxidativo. Além disso, introduzir o chocolate na dieta dos pacientes teve boa adesão, favorecendo o aumento de calorias e nutrientes, além da sensação de prazer. Os autores destacam ainda que o chocolate tem a vantagem de ser facilmente comprado e pode ser usado para incrementar uma refeição.

Vale enfatizar que aqui estamos abordando a alimentação por via oral, ou seja, de pessoas que supostamente conseguem, em alguma medida, alimentar-se sem engasgos e/ou outras queixas que possam colocá-las em algum risco.

Finalizo com uma observação importante, esses conceitos devem ser considerados no ambiente hospitalar, um lugar normalmente frio (em todos os sentidos), onde a comida de conforto pode ser um alento para a o corpo e a alma; pode ser uma expressão de acolhimento, de carinho e de respeito.

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Bibliografía consultada

Benarroz M. Comendo com prazer até o fim: o papel da alimentação da vida de pessoas com câncer avançado na perspectiva dos cuidados paliativos. São Paulo: Scortecci, 2020.

Gimenes-Minasse MHSG. Comfort food: sobre conceitos e principais características. Contexto da alimentação – Revista de Comportamento, Cultura e Sociedade. 2016; 4(2): 92-102.

Spence, C. Comfort food: A review. International Journal of Gastronomy and Food Science. 2017; 9105109.

Vettori JC et al. Effect of chocolate on older patients with cancer in palliative care: a randomised controlled study. BMC Palliat Care. 2022; 21(1):5.

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